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9 de fevereiro de 2024
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DESAFIOS E PERSPECTIVAS PARA A MOBILIDADE URBANA SUSTENTÁVEL NO BRASIL

O transporte urbano coletivo representa um serviço de fundamental importância para a mobilidade, a qualidade de vida e o progresso…

O transporte urbano coletivo representa um serviço de fundamental importância para a mobilidade, a qualidade de vida e o progresso urbano. Contudo, enfrenta uma série de desafios, a saber:

  • A elevada tarifação, que impede o acesso da parcela de baixa renda da população e fomenta a preferência pelo uso de veículos individuais.
  • A deficiência na infraestrutura, comprometendo a eficácia, segurança e comodidade tanto dos usuários quanto dos operadores do sistema.
  • A emissão de gases de efeito estufa, contribuindo para o aquecimento global e a poluição atmosférica, impactando negativamente a saúde pública e o meio ambiente.
  • A gestão e o planejamento deficientes, dificultando a integração, fiscalização e implementação de inovações no transporte público.

Para transpor tais obstáculos, é imperativo investir em tecnologias inteligentes e sustentáveis, visando aprimorar a qualidade do serviço, reduzir custos e emissões, além de elevar a satisfação dos usuários. Ademais, é crucial fortalecer a governança e promover a participação social, garantindo que o transporte público seja planejado e administrado de maneira democrática e transparente.

Legislação e Mobilidade Urbana

No que tange à sua indagação, diversas legislações atuam em prol da otimização da mobilidade urbana no território nacional, a saber:

  • O Estatuto das Cidades (Lei 10.257/01), que delineia os parâmetros gerais da política urbana, incluindo a mobilidade como uma das facetas das funções sociais do espaço citadino.
  • A Lei 12.587/12, que institui a Política Nacional de Mobilidade Urbana, determinando os princípios, objetivos, diretrizes e instrumentos para a promoção de uma mobilidade sustentável, integrada e acessível.
  • A Lei 13.089/15, também denominada Estatuto da Metrópole, que regula o planejamento, gestão e execução das atribuições públicas de interesse coletivo em áreas metropolitanas e aglomerações urbanas, abrangendo a mobilidade como uma delas.
  • A Lei 13.683/18, que promove alterações em alguns dispositivos das legislações anteriores, como a ampliação do prazo para a elaboração dos planos de mobilidade urbana pelos municípios e a inclusão de novos critérios para a priorização dos modos de transporte não motorizados e coletivos.

Essas normativas, em princípio, asseguram uma política pública eficaz no âmbito da mobilidade urbana, ao estabelecerem diretrizes e preceitos para o planejamento, execução e avaliação das iniciativas voltadas à melhoria da mobilidade nas urbes. Todavia, na prática, enfrentam-se diversos desafios e obstáculos à implementação dessas leis, tais como a escassez de recursos financeiros, a resistência de determinados segmentos da sociedade, a falta de integração entre os distintos níveis de governo e a deficiência de dados e indicadores para o monitoramento e fiscalização das políticas de mobilidade.

Deste modo, é imperativo um maior engajamento e participação por parte dos gestores públicos, operadores do sistema de transporte, usuários e sociedade civil, de forma a garantir o efetivo cumprimento das leis de mobilidade urbana e contribuir para o aprimoramento da qualidade de vida nas cidades.

Desafios para Integração dos Meios de Transporte

Para mitigar a defasagem na abrangência do transporte público coletivo, é imprescindível adotar medidas como:

  • Expansão da malha de cobertura e aumento da frequência dos veículos, visando atender à demanda populacional e diminuir o tempo de deslocamento.
  • Redução da tarifa, com o intuito de tornar o transporte público mais acessível e atrativo, assim como para reduzir a utilização de veículos particulares.
  • Implementação de medidas para promover maior segurança, conforto e qualidade nos serviços, visando aumentar a satisfação dos usuários e evitar a evasão de passageiros.
  • Investimento em tecnologias inteligentes e sustentáveis, como a eletrificação, para aprimorar a eficiência operacional, a segurança e a redução das emissões de gases do efeito estufa.
  • Fortalecimento da gestão e do planejamento integrados, com a participação social, para assegurar a implementação e a fiscalização efetiva das políticas de mobilidade urbana.

Hiato de Infraestrutura de Mobilidade Urbana

A análise do déficit de infraestrutura de mobilidade urbana no Brasil em termos quantitativos é complexa devido a uma variedade de variáveis influentes, tais como demanda, oferta, qualidade e custo dos serviços de transporte. No entanto, alguns indicadores podem oferecer uma visão da situação atual e dos desafios em questão:

  • Em 2014, o Brasil contava com 10,7 quilômetros de transporte de média e alta capacidade por cada milhão de habitantes urbanos. Embora represente um avanço em relação aos 8,8 km/milhão de habitantes em 1980, este aumento é insuficiente diante das necessidades de mobilidade da população.
  • Em 2020, apenas 36,5% dos municípios brasileiros com mais de 250 mil habitantes possuíam planos de mobilidade urbana, conforme exigido pela Política Nacional de Mobilidade Urbana. Além disso, somente 17,6% destes municípios possuíam sistemas de bilhetagem eletrônica integrada.
  • No ano de 2019, o preço médio da passagem de ônibus urbano no Brasil foi de R$ 4,25, representando um aumento de 7,6% em relação a 2018. Esse valor correspondia a cerca de 14% do salário mínimo vigente na época.
  • Em 2018, o transporte coletivo por ônibus representou 85,7% dos deslocamentos realizados por transporte coletivo no Brasil, enquanto o transporte sobre trilhos (metrô, trem e VLT) correspondeu apenas a 14,3%. Ademais, o transporte individual motorizado (carro e moto) foi responsável por 38,1% dos deslocamentos urbanos, enquanto o transporte não motorizado (bicicleta e a pé) respondeu por 32,5%.

Essas estatísticas evidenciam um significativo déficit de infraestrutura de mobilidade urbana no Brasil, o qual impacta diretamente a qualidade de vida, a inclusão social e o desenvolvimento sustentável das cidades. Para mitigar esse déficit, torna-se necessário investir em políticas públicas que priorizem o transporte coletivo e não motorizado, promovendo acessibilidade, eficiência, segurança e integração.

Propostas para Mobilidade Urbana Sustentável

A respeito da sua indagação, os obstáculos para a integração dos modais de transporte urbano com o intuito de obter melhorias nos sistemas, especialmente através da progressão de novos paradigmas de concessão e parcerias público-privadas (PPPs), englobam os seguintes aspectos:

  • Deficiência de planejamento e coordenação entre os distintos níveis governamentais (federal, estadual e municipal) e os diversos operadores do sistema de transporte (públicos e privados).
  • Desafio de financiamento e sustentabilidade econômica dos empreendimentos de mobilidade urbana, os quais dependem de fontes diversas e voláteis de recursos, como tributos, tarifas, subsídios, empréstimos e investimentos privados.
  • Oposição de alguns segmentos da sociedade, tais como os usuários, os sindicatos, os empresários e os políticos, os quais podem apresentar interesses antagônicos ou discrepantes em relação aos modelos de concessão e PPPs.
  • Complexidade jurídica e regulatória dos contratos de concessão e PPPs, que abarcam aspectos como a definição de responsabilidades, direitos, obrigações, metas, indicadores, penalidades, reajustes, revisões, rescisões, arbitragens, entre outros.
  • Necessidade de transparência e controle social nos processos de licitação, contratação, execução e fiscalização dos projetos de mobilidade urbana, a fim de prevenir fraudes, corrupção, desperdícios, ineficiências e desvios de recursos.

Para superar esses desafios, é imprescindível uma maior articulação e colaboração entre os diversos intervenientes na mobilidade urbana, bem como uma maior participação e envolvimento da sociedade civil. Ademais, é fundamental que os modelos de concessão e PPPs sejam embasados em critérios técnicos, econômicos, sociais e ambientais, visando assegurar a qualidade, a eficiência, a acessibilidade, a sustentabilidade e a equidade dos serviços de transporte.

Sobre a Lei de Mobilidade Urbana

Em relação a Legislação de Mobilidade Urbana (Lei 12.587/12) determina que os municípios com uma população superior a 20 mil indivíduos devem conceber e aprovar seus Planos de Mobilidade Urbana (PMU), levando em consideração os princípios, objetivos, diretrizes e instrumentos estabelecidos pela Política Nacional de Mobilidade Urbana. Tais planos devem ser harmonizados com os Planos Diretores, com o propósito de assegurar a sustentabilidade, eficiência e acessibilidade nos deslocamentos e na ordenação urbana.

O prazo inicial para a elaboração dos PMUs estava estipulado até abril de 2015, entretanto, foi sucessivamente prorrogado por meio de medidas provisórias e leis. A mais recente extensão foi promulgada pela Lei 14.671/23, publicada em dezembro de 2023, estendendo o prazo até 12 de abril de 2024 para os municípios com uma população superior a 250 mil habitantes, e até 12 de abril de 2025 para aqueles com uma população igual ou inferior a 250 mil habitantes.

Conforme dados fornecidos pelo Ministério do Desenvolvimento Regional, até novembro de 2023, somente 36,5% dos municípios com uma população superior a 250 mil habitantes haviam desenvolvido seus PMUs, enquanto entre os municípios com uma população igual ou inferior a 250 mil habitantes, esse índice era de apenas 8,9%. Dessa forma, persiste um considerável desafio para que os municípios brasileiros observem a legislação e elaborem seus planos de mobilidade urbana, os quais são cruciais para aprimorar a qualidade de vida, a inclusão social e o desenvolvimento sustentável das cidades.

O que é preciso ser feito

A mobilidade urbana sustentável, em sua essência, refere-se aos métodos de deslocamento na cidade que não acarretam danos ao meio ambiente, englobando o transporte público, o transporte não motorizado (bicicleta, caminhada, patinete, etc.) e os veículos movidos a fontes renováveis (etanol, biometano, eletricidade, etc.). Para alcançar a mobilidade urbana sustentável no Brasil, é necessário adotar medidas como: promover o uso de modais alternativos ao veículo particular mediante incentivos fiscais, tarifários, educacionais e culturais; eleger fontes energéticas renováveis e de baixa emissão de poluentes para abastecer tanto os meios de transporte públicos quanto individuais; concentrar esforços na melhoria da experiência do usuário, garantindo serviços de transporte público que ofereçam qualidade, eficiência, segurança, conforto e acessibilidade, com integração modal e tarifária; abordar conflitos no planejamento urbano visando soluções que conciliem as demandas de mobilidade com as de uso e ocupação do solo, preservação ambiental, inclusão social e desenvolvimento econômico; e envolver a sociedade civil no planejamento, gestão e fiscalização das políticas de mobilidade urbana, assegurando participação, transparência e controle social.

Quanto ao transporte urbano não motorizado, embora esteja em ascensão no país, enfrenta diversos desafios, incluindo a carência de infraestrutura apropriada, a insegurança no trânsito, barreiras culturais e a falta de incentivos públicos. Segundo dados do Ipea de 2018, o transporte não motorizado representou 32,5% dos deslocamentos urbanos no Brasil, sendo a bicicleta responsável por 3,9% e a caminhada por 28,6%. Entretanto, esses modos de transporte ainda carecem de valorização e priorização nas políticas de mobilidade urbana, que frequentemente favorecem o transporte individual motorizado. Para estimular o uso do transporte não motorizado, é necessário adotar medidas como: expandir e aprimorar a infraestrutura cicloviária e de pedestres, incluindo ciclovias, ciclofaixas, calçadas, faixas de pedestres, semáforos, sinalização e iluminação; fortalecer a segurança e a educação no trânsito, visando reduzir os acidentes envolvendo ciclistas e pedestres e conscientizar os condutores sobre a importância de respeitar e conviver com os demais modais; promover e facilitar o compartilhamento de bicicletas e patinetes, por meio de sistemas públicos ou privados integrados ao transporte público e com tarifas acessíveis; e lançar campanhas e programas de incentivo ao transporte não motorizado, como o Dia Mundial Sem Carro, o Bike Anjo, o Pedala Manaus, o Bike PE, entre outros.

O que está sendo feito

Atualmente, no Brasil, um exemplo notável é o projeto Nova RMTC (Rede Metropolitana de Transporte Coletivo) na Região Metropolitana de Goiânia. Esse projeto engloba intervenções, aprimoramentos e aportes na infraestrutura e na frota do transporte coletivo. O investimento total na Nova RMTC será de R$ 1,6 bilhão ao longo de três anos, com a garantia da CDTC (Câmara Deliberativa do Transporte Coletivo) de que não ocorrerá aumento na tarifa dos usuários. O montante será distribuído em R$ 230 milhões para o Plano de Ação Imediata (PAI), R$ 210 milhões em obras e R$ 1,2 bilhão na renovação da frota.

O PAI abrange a revitalização e a manutenção dos pontos de parada, equipando-os com sinalização, identificação e QR Code para fornecer orientações aos passageiros em tempo real. Além disso, a Nova RMTC introduzirá um Novo Plano Operacional (NPO) para determinar a quantidade e o tipo de ônibus e viagens, visando estabelecer um novo padrão de serviço.

Uma das inovações é a eletrificação do Sistema BRT, que opera em corredores dedicados. Os corredores Eixo Anhanguera e Eixo Norte-Sul serão os primeiros a receber os novos ônibus elétricos. A eletrificação do Sistema BRT não apenas reduzirá a poluição e o ruído, mas também melhorará a qualidade do ar e a saúde da população.

Em contrapartida ao Governo Federal, que tem adotado medidas prejudiciais ao transporte público, como cortes de recursos em favor da aviação, o Governo de Goiás está demonstrando um modelo de sucesso. O projeto Nova RMTC é uma iniciativa pioneira e inovadora na gestão metropolitana do transporte coletivo no Brasil, que servirá de modelo e inspiração para outras regiões do país. Além de satisfazer as demandas e necessidades dos usuários do transporte público, o projeto está alinhado com o Novo Marco Legal do Transporte Público, que estabelece diretrizes para melhorar a qualidade, eficiência e sustentabilidade do serviço.

Destaca-se que Goiânia é a única capital estadual no Brasil cuja tarifa de ônibus no sistema de transporte coletivo permanece congelada desde 2019. Esse congelamento é viabilizado por meio de um subsídio mantido pelo Governo de Goiás em colaboração com as prefeituras, abrangendo um total de 17 cidades da Região Metropolitana de Goiânia. Este subsídio beneficia aproximadamente 254 mil pessoas mensalmente, resultando em um total de 12 milhões de viagens durante o período considerado.

O subsídio ao transporte coletivo foi estabelecido pelo Governo de Goiás em 2020 como uma medida de assistência emergencial à população durante a pandemia de Covid-19, mediante um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) celebrado com o Ministério Público. No final de 2021, a Lei Complementar 169 foi promulgada, proporcionando uma reestruturação na Rede Metropolitana de Transporte Coletivo e regulamentando o processo de pagamento do subsídio.

Desde 2020 até a presente data, o Estado de Goiás já aportou aproximadamente R$ 300 milhões para a cobertura parcial dos custos. O repasse mensal corresponde a cerca de R$ 12,4 milhões. A tarifa vigente no sistema de transporte coletivo (incluindo o sistema integrado do Eixo Anhanguera) está fixada em R$ 4,30 para os usuários, enquanto o valor do subsídio corresponde a R$ 3,2882. Dessa forma, sem o subsídio, o preço da passagem seria de aproximadamente R$ 7,60 para a população.

Portanto, o projeto Nova RMTC é um exemplo prático de como é possível promover um desenvolvimento integrado e equitativo, beneficiando a população e o meio ambiente, em consonância com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU.



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