Mova-se
7 de abril de 2022
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Quem ganha com a união Táxi/ Uber?

Miguel Angelo Pricinote – Coordenador Técnico do Mova-se | Especialista em Transporte Público | Pesquisador MaaS No último final de…

Miguel Angelo Pricinote – Coordenador Técnico do Mova-se | Especialista em Transporte Público | Pesquisador MaaS

No último final de semana passada recebi um artigo muito interesse sobre o acordo entra a Uber e os taxistas. O titulo era bastante chamativo: Táxis e Uber: um acordo com o diabo? Neste texto pretendo abordar os pontos levantados no artigo e também fazer uma reflexão entre a aproximação da Uber com transporte público e principalmente em relação ao Modelo de Negócio chamado Mobilidade como Serviços – MaaS

Esta é uma grande mudança em uma indústria um tanto volátil que não viu mudanças significativas (pelo menos no lado da mobilidade) nos últimos anos. E aqueles que entraram no mercado chutando a porta – Uber – agora busca apoio e segurança do poder estatal.

Tentar avaliar o impacto desse acordo é realmente mais difícil do que parece. Quem são os principais vencedores e perdedores? Para avaliar isso, o artigo apresentou, na visão do autor, quem seriam os principais stakeholders:

Neste sentido, fica claro que os principais vencedores nesta situação são claramente os taxistas, pelo menos a curto prazo. Quando o Uber entrou no mercado, foi devastador para os taxistas e parecia que o o fim desta modalidade de deslocamento estava próxima.

Um benefício claro deste acordo é que, por exemplo, em Nova York (EUA) os taxistas, que muitas vezes não têm permissão para pegar passageiros fora de Manhattan, poderão usar o UberX, em vez de apenas ser um táxi. 

E, finalmente, eles terão acesso à vasta demanda do Uber. Como Ben Thompson gosta de dizer (em uma tradução livre), a oferta gosta de ir onde a demanda está, e a demanda é definitivamente com o Uber. 

Outro grupo que, no curto prazo, se beneficiará disso são os consumidores pois com o serviço da Uber (principalmente aqui no Brasil) vem sofrendo várias críticas e parece que é esta forma de deslocamento que tende a acabar em breve.

Não há dúvida de que no curto e médio prazo (enquanto nos mantivermos principalmente em torno do equilíbrio existente), os principais perdedores são os atuais motoristas do Uber. Dentro da economia gig, a economia é bastante simples: quanto mais oferta você tiver, menores serão os preços e maior o tempo ocioso dos motoristas. Em outras palavras, os atuais motoristas do Uber ganharão menos dinheiro com o Uber e terão que esperar mais tempo pelas corridas. 

Mas vamos dar uma olhada na Uber. A reação óbvia é assumir que esta é uma grande vitória para o Uber, e de muitas maneiras é. Pois como mencionado acima, a Uber terá acesso a uma oferta maior de carros e motoristas, diminuindo assim a necessidade de oferecer incentivos adicionais, o que vem matando a Uber financeiramente há anos. Desde os primeiros dias, ficou claro que os preços que o Uber estava cobrando não eram suficientes para pagar os motoristas, então teve que encontrar motivadores externos para manter os motoristas dirigindo. Isso não é verdade apenas para o Uber, mas para toda a economia gig. Por exemplo, analisando a demonstração financeira da Lyft, pode-se concluir que os incentivos para os motoristas giram em torno de US$ 1 a US$ 3 por corrida. Esses incentivos dispararam recentemente quando a demanda por caronas aumentou, mas os motoristas estavam relutantes em voltar ao trabalho. 

Outro motivo para estar otimista com o acordo é o grande desejo da Uber de possuir o espaço de mobilidade, da mesma forma que a Amazon quer ser dona do espaço de varejo de comércio eletrônico. Em ambos os casos, as empresas estão dispostas a listar qualquer entidade que queira ser listada em sua plataforma. Na verdade, tenho certeza de que o Uber ficaria feliz em listar o Lyft em seu aplicativo se pudesse (embora esteja bem claro que o Lyft não estaria interessado). Esse era o objetivo o tempo todo. mas a suposição de que todos os clientes e motoristas deixariam suas opções atuais e mudariam para o Uber não se concretizou. Então fechar esse acordo com os táxis é um atalho para chegar lá. Em um mundo onde os clientes seguem preços mais baixos e oferta mais rápida, e a oferta segue os clientes, isso parece uma vitória óbvia para a Uber.

E, finalmente, a Uber não é apenas uma empresa de mobilidade que transporta pessoas, mas também tem outros serviços como UberEats e entrega de supermercado. Em Hong Kong, onde a Uber já faz parceria com milhares de táxis, a empresa afirma que 35% dos usuários que chamam um táxi pelo aplicativo também acabam usando os outros serviços da Uber. 

Porém o apresenta um grande alerta: como este acordo pode ser uma vitória completa para Uber e ser uma perda óbvia para os seus motoristas?

Como mencionado, os atuais motoristas da Uber estão obviamente perdendo com este acordo. Mas dentro do mercado, ninguém permanece do lado perdedor por muito tempo. Reflita: Se os preços dos deslocamentos caírem, os motorista irão buscar as plataformas que têm mais demanda e com ganhos potencialmente mais altos. 

Em outras palavras, não acho que podemos supor que o número de motoristas do Uber permanecerá fixo. Ele será equilibrado com base no número de táxis que realmente usam o Uber. O resto pode mudar para plataformas alternativas onde terão melhores opções. 

É importante mencionar que o impacto de tal acordo será claramente mais pronunciado em alguns lugares e menos em outros. A cidade de Nova York tem 40 mil táxis e 80 mil motoristas de Uber, então a adição de motoristas de táxi pode sobrecarregar a economia gig da cidade. São Francisco, por outro lado, tem cerca de 50 mil motoristas de Uber, mas apenas 1.800 motoristas de táxi.

Isso não acontecerá em um dia, mas a longo prazo, o novo equilíbrio será aquele em que o Uber depende muito menos da economia gig. Se isso é bom ou ruim ainda está para ser visto. Os motoristas de táxi eram os motoristas originais da economia antes mesmo de usarmos o termo plataformas. A única diferença era que, eles precisavam ter licença para operar e regras a serem seguidas. O fato de eles se juntarem ao epítome das plataformas gig como trabalhadores é apenas a próxima evolução da economia gig. Neste sentido as plataformas gig terão que aprender a lidar com grupos de trabalhadores potencialmente organizados, neste caso, protegidos e representados por Sindicatos e Associações.

Outro ponto é em relação a Uber que no primeiro momento me enganou. Pois acreditei que eles eram um novo player que iria repensar o modelo atual da mobilidade. Mas a startup americana mostrou cada vez mais a sua intenção de ser monopolista e usar de força para entrar nos mercados e depois buscar se associar com entes públicos.

Tal posicionamento se demonstrou mais claro quando um estudo apresentado pela Prefeitura de São Paulo, propôs liberar o uso do Bilhete Único em plataformas como Uber e 99. A integração prevista estimula que os trechos iniciais ou finais da viagem – cerca de dois quilômetros até uma estação de metrô ou um terminal de ônibus – sejam feitos com aplicativos. O valor seria pago com o Bilhete Único. Depois, o passageiro continuaria seu trajeto usando a rede pública, com desconto no valor da passagem. Lembrando que a tarifa em São Paulo recebe subvenção pública.

O que no primeiro momento pode passar uma ideia de que é uma parceria inofensiva e que só traria mais comodidade aos usuários. Na verdade é um verdadeiro cavalo de Troia, uma vez que a Uber ao receber as informações do transporte público e não repassar a suas informações (quantidade de viagens, número de motoristas, origem e destino dos passageiros…) acabaria gerando uma assimetria de informações, pois com os dados do transporte público a Uber poderia se reposicionar melhor no mercado.

Já o poder público por sua vez continuaria vendado em relações a possíveis ações públicas voltadas a mobilidade urbana, já que os dados dos aplicativos de mobilidade individual não são abertos. 



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